05/08/2009

É o vento que as leva


Cortaderia selloana (Schult. & Schult. f.) Asch. & Graebn. [Reserva de São Jacinto]

As gramíneas são as plantas mais evoluídas que se conhecem. Tão evoluídas que parecem ter-se preparado - usando, à distância de 60 milhões de anos, de uma capacidade divinatória sem paralelo - para um holocausto nuclear que não deixe vivo qualquer animal à face da Terra. Não dependem de ninguém para a polinização e para a disseminação das sementes: o vento faz de graça ambos os serviços. E, porque não precisam de atrair os bons ofícios de nenhum ser vivo, reduzem as flores à sua forma mais despojada, despindo-as de qualquer enfeite.

A relva que pisamos - e tantas vezes amaldiçoamos pelo consumo exagerado de água e pela fraca valia ambiental - é uma gramínea; e também provém das gramíneas boa parte da comida que nos sustenta: arroz, trigo, milho, aveia, cana-do-açucar, etc. Os bambus são gramíneas que podem ser empregues para fabricar mobiliário leve. E, finalmente, há as gramíneas que seriam ornamentais se fosse possível usá-las com comedimento, mas que aproveitaram a ingenuidade humana e a cumplicidade do vento para se transformarem em pragas. É o caso emblemático da erva-das-pampas (Cortaderia selloana), originária da Argentina e do sul do Brasil, que foi introduzida por cá como planta de jardim e se tornou das piores infestantes do litoral português, quase tão grave como as acácias e os chorões (Carpobrotus edulis).

É comum encontrarem-se terrenos abandonados (lotes para construção ou antigos campos agrícolas) completamente forrados por esta «erva» vigorosa e emplumada. Mas, ao contrário de outras plantas daninhas, a erva-das-pampas não é menina para se arrancar com as mãos nuas: não só as folhas são cortantes (daí o nome Cortaderia), como a touceira por elas formada ultrapassa os dois metros de altura; além disso, é uma planta rizomatosa, com raízes fundas e bem firmadas. O único modo prático de limpar uma infestação é recorrer a maquinaria pesada.

Em Portugal faz-se muito pouco para combater as invasões vegetais; mesmo em áreas protegidas (como a Reserva de São Jacinto) as plantas daninhas proliferam sem serem incomodadas. Talvez seja uma luta perdida, mas a impressão que dá é que nem chegou a haver luta.

2 comentários :

José Batista da Ascenção disse...

Um outro aspecto que atesta o extraordinário poder adaptativo das gramíneas é o facto de muitas delas serem plantas anuais, crescendo em poucos meses, florescendo e produzindo sementes, após o que morrem ("completamente"!...) ficando reduzidas à semente, estrutura normalmente muito bem adaptada à conservação e à dispersão. Assim, nas estações desfavoráveis, as plantas estão reduzidas "ao mínimo", pelo que escapam às agressões ambientais...

Luz disse...

mais umas coisinhas que aprendi hoje. Obrigado
Luz
PS. Mas destas gramíneas eu gosto. São mesmo muito bonitas!