04/10/2013

Feto de imitação

Dryopteris aemula (Aiton) O. Kuntze



Não sendo este feto menos genuíno do que outros que por aqui têm desfilado, e muito menos sendo feito de plástico, por que o acusamos de ser um feto de imitação? É que a palavra latina aemulus, da qual deriva o epíteto aemula, significa «que procura imitar». Fica então estabelecido que, na opinião de quem primeiro baptizou o feto — o escocês William Aiton (1731-1793), que lhe chamou Polypodium aemulum —, ele é culpado de alguma tentativa de imitação. Imitação de outros fetos, entenda-se. Ele será pois especialmente confundível com certos outros fetos, sem que, misteriosamente, esses outros sejam no mesmo grau confundíveis com ele. Mas é melhor não aprofundarmos o assunto, pois a taxonomia botânica não é um ramo das ciências exactas e não tem obrigação de se subordinar à lógica.

Nas ilhas açorianas há bons motivos para o feto-de-imitação ser confundido com alguns dos seus congéneres, especialmente com aqueles a que está ligado por laços de seiva (equivalente vegetal dos laços de sangue). Do matrimónio do D. aemula com o endemismo açoriano D. azorica nasceu um outro feto endémico do arquipélago, o arrepiado D. crispifolia. Os três apresentam folhas com formatos semelhantes, e o D. aemula, como documentam as fotos acima, não está livre de arrepios, embora se mostre bastante menos espasmódico do que o seu descendente. Contudo, as frondes do D. aemula, com 30 a 60 cm de comprimento, são mais curtas do que as dos outros dois, que podem medir até 90 cm (as do D. crispifolia) ou 1,5 m (as do D. azorica); são, além disso, de um verde claro e baço, em contraste com o tom mais escuro e brilhante do D. azorica. E há um detalhe morfológico importante para distinguir os dois consortes: nas pinas basais do D. aemula, a primeira pínula inferior junto à ráquis é mais comprida do que as restantes (confira na 3.ª foto), enquanto que, no D. azorica, a segunda e terceira pínulas são mais compridas do que a primeira (veja aqui).

Embora em algumas ilhas seja pouco comum, o D. aemula faz o pleno do arquipélago açoriano, no que está acompanhado pelo D. azorica. A parceria desfaz-se no resto da área de distribuição do primeiro (Península Ibérica, desde a Galiza ao País Basco, costa atlântica francesa, Grã-Bretanha e Irlanda, Turquia, Cáucaso, Madeira e Canárias), pois o segundo, em obediência ao seu estatuto de endemismo açoriano, está proibido de emigrar para outras paragens. Com o resultado de o D. aemula, qual marinheiro de longo curso, ter ensaiado outras aventuras amorosas nos seus vários portos de abrigo. Um desses casos aconteceu com o D. maderensis, endémico da ilha da Madeira, e deu origem ao D. guanchica — um feto que, tal como o seu progenitor mais viajado, tem poiso nas ilhas atlânticas (Madeira e Canárias) e no continente europeu (só Península Ibérica).

Sem comentários :