28/10/2010

Lagoa dos limónios



Lagoa de Carregal (Ribeira, Galiza)

O Parque Natural das Dunas de Corrubedo e lagoas de Carregal e Vixán ocupa quase mil hectares do concelho galego da Ribeira, na província da Corunha. É lá que os aficcionados portugueses de orquídeas podem, entre Julho e Agosto, admirar a Epipactis palustris, espécie que até à primeira metade do século XX era abundante no litoral centro de Portugal (em especial na zona de Ílhavo) mas que desde então parece ter-se sumido do país. São porém muitos os motivos para visitar essa zona húmida noutras alturas do ano. No conjunto de habitats lá representados (sapal, prados arenosos húmidos, dunas, rochas costeiras, matos e bosques) vivem 247 espécies de plantas, algumas raras ou ausentes de Portugal, e o rodopio de aves residentes ou migratórias é um grande atractivo para ornitólogos amadores ou profissionais. O pessoal do centro de atendimento, ao contrário do que é regra em Portugal, conhece o património natural à sua guarda e sabe dar indicações úteis aos visitantes. E não tem só indicações para dar. A junta da Galiza fez publicar seis brochuras a cores, de 60 a 90 páginas cada, sobre os diversos aspectos do parque natural: guia das aves, guia dos répteis e anfíbios, dos coleópteros, da flora, dos orquídeas, dos percursos. São livrinhos com boas fotos e bons textos, de qualidade mais que aceitável para serem vendidos ao público, mas que são oferecidos a quem os solicite - e eu até preferia tê-los pago. E torna-se inevitável comparar a informação disponibilizada nesse parque natural galego com o que se passa, por exemplo, no Parque Nacional da Peneda-Gerês. Nas «portas» do PNPG, os funcionários que nos atendem - admito que com simpatia -, além de não saberem rigorosamente nada, só têm para venda, a 1 euro por unidade, uns folhetos sem qualquer informação útil. Um deles, sobre turfeiras, continha só generalidades que poderiam ter sido tiradas da Wikipedia, nada dizendo sobre a flora específica ou a localização das turfeiras do PNPG.

As fotos em cima mostram a lagoa de Carregal na maré vaza. Mais uma ou duas horas e o mar começaria a meandrar pelos canais que cruzam as dunas, enchendo de água salgada a extensa concavidade arenosa. Há zonas que ficam submersas e outras a que só chega um fio de água, distinção de que as duas espécies de Limonium que ali coexistem bem sabem tirar partido. O Limonium vulgare, de maior envergadura, gosta de locais encharcados: ocupa as margens da lagoa mas avança também para o seu interior. Para o L. binervosum, essas margens marcam uma linha que ele se recusa a ultrapassar, preferindo concentrar-se nos lugares onde a água nunca chega ou o faz só raramente.



Limonium binervosum (G. E. Sm.) Salmon

O L. binervosum tem folhas de 2 a 6 cm de comprimento dispostas em roseta basal, e hastes florais esparsamente ramificadas que podem chegar aos 45 cm de altura. As flores, que aparecem entre Julho e Setembro, são pequenas - até 7 mm de diâmetro - e não param quietas à menor brisa, boicotando seriamente o trabalho do fotógrafo. O efeito ornamental destas plantas em flor, quando reunidas em grande número, não fica aquém do da Armeria, outra planta da mesma família que frequenta habitats costeiros. Mas, vá-se lá saber porquê, pouca gente se lembra de gabar a beleza dos limónios.

A consulta dos manuais não esclareceu cabalmente se o Limonium binervosum ocorre ou não em Portugal. Entre a Nazaré e Peniche há muitos limónios, mas por ser comum a hibridação entre espécies é difícil distingui-los. O mais frequente parece ser o L. virgatum, que não anda longe de ser um sósia perfeito do L. binervosum. Para agravar a confusão, existe em rochedos e falésias da costa cantábrica da Galiza uma espécie muito semelhante, o L. dodartii, tão raro que se considera em perigo em extinção. Contudo, há quem defenda que L. dodartii e L. binervosum são sinónimos - e este último, a avaliar pela amostra na lagoa de Carregal, não é de modo nenhum escasso.

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