02/07/2009

Há vida depois do fogo


Carvalhos-negrais (Quercus pyrenaica) mas também, à esquerda, um jovem castanheiro

A excursão de sexta-feira aos castanheiros monumentais do Sabugal permitiu-nos ter uma ideia, necessariamente incompleta, da paisagem do concelho. O percurso foi em grande parte por estradões de terra batida que nem devem constar dos mapas; e, como não anotei os lugares por onde passámos, dificilmente conseguirei reencontrá-los quando lá regressar. E trata-se de um concelho vasto: 827 km^2 - vinte vezes maior do que o Porto.

Este território da Beira raiana, que visitei agora pela primeira vez, é completamente diferente daquela outra Beira que se estende entre Viseu, Guarda e Coimbra. Os eucaliptos estão ausentes, as acácias pouco se vêem e, embora haja alguns pinhais, eles estão longe de ser dominantes. A ausência desta competição (que em geral é avassaladora) permite a existência de algo que julgava já extinto em Portugal: extensas matas de carvalhos surgidas por regeneração natural. Não se trata do carvalho-alvarinho (Quercus robur) com que estamos familiarizados na faixa noroeste do país, mas sim do carvalho-negral (Quercus pyrenaica), que se distingue facilmente pelas suas folhas penugentas, aveludadas ao tacto. Nenhum dos carvalhais de Q. robur que conheço em Portugal tem um futuro tão promissor como estas matas de carvalho-negral no território raiano. Matas tão exuberantes que permitiriam, sem o menor risco de esgotamento, a exploração florestal para produção de madeira.



Que não haja eucaliptos e sejam poucos os pinheiros não garante que os incêndios não aconteçam, embora lhes modere a intensidade. Pelo contrário, eles devem até ser frequentes, pois a maioria das matas que avistámos era formada por árvores muito jovens. Visitámos uma área recém-ardida (foto acima, mostrando um carvalho que sobreviveu ao fogo) onde se viam rebentos de carvalho a despontar da terra enegrecida. Quase não há barreiras para o fogo: em vez de campos de cultivo ou pastagens a separar as matas, predominam os giestais, também eles facilmente combustíveis. Como em quase todo o país rural, são estas as marcas deixadas no território pela depauperação populacional, pelo abandono dos campos e pela diminuição da pastorícia.

Nem o fogo nem os carvalhos vão desaparecer da região. O problema é que o ciclo de vida dos carvalhais parece ser muito curto (talvez uns 10 ou 20 anos), o que, além de trazer evidentes prejuízos ambientais, significa um grande desperdício económico. Há vida no Sabugal, mas tudo pode arder de um momento para o outro. A boa notícia é que a vida não acaba aí.

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